12/06/2020 às 10h36min - Atualizada em 12/06/2020 às 10h36min

Redação Maricá: Pessoas que vivem nas ruas do Rio contam como é enfrentar a pandemia

Em meio à pandemia do coronavírus, a recomendação é clara: sair de casa somente quando extremamente necessário. Mas, há inúmeras pessoas que têm a rua como casa e que ficam ainda mais expostas à toda sorte de vulnerabilidade. Além do coronavíirus, os sem teto amargam o preconceito e a exclusão.

“A gente está aqui jogado, largado e abandonado. A nossa casa é aqui, já é a rua”, enfatizou um sem teto.

“Estou conversando igual estou conversando com você, que está com a máscara agora. Parece que eu sou um bicho”, disse uma moradora de rua que não tem máscara para se proteger”, desabafou uma moradora de rua.

“As pessoas têm até medo de chegar perto da gente porque somos morador de rua”, reforçou Leandro da Costa Duarte.

Acostumado com os riscos de se viver sem um abrigo, Carlos Alberto dos Santos disse não temer a Covid-19. “Eu já vivi 78 anos e não estou nem aí. Se Deus levar, levou”, disse Carlos Alberto dos Santos.

Um homem que não quis se identificar chegou ao Rio dias antes da suspensão dos ônibus intermunicipais por causa da pandemia do novo coronavírus. Sem dinheiro para voltar para casa, disse para a família que conseguiu um emprego.

“Vim para tentar algo melhor, mas aí aconteceu o pior. Até para ir embora, não tem como, né?”, lamentou.

Sem trabalho, ele vasculha lixeiras e caçambas em busca de metal, cobre e alumínio. O dinheiro que consegue nem sempre lhe garante uma refeição digna.

“Moro na rua, mas não sei ficar pedindo nada para ninguém”, disse. Questionado sobre porque não pede ajuda, ele revela ter “vergonha”.

Em Copacabana, na Zona Sul, há um homem que vive há décadas na calçada. Ele construiu um pequeno abrigo embaixo de um prédio. “Tem 50 anos que eu moro aqui. Eu era sapateiro”, contou.

No abrigo dele, construído com madeiras e telhado de alumínio, é decorado com uma pintura com dois pássaros, o sol, a lua, estrelas e uma planta. Dentro, ele conta com uma cama improvisada, um ventilador e alguns objetos pessoais. “Tem um varal para um lado, e outro varal para o outro”, mostrou.

Mas a grande maioria dos moradores de rua não contam com um abrigo, mesmo que improvisado, e precisam buscar refúgio onde conseguem. Próximo da Cinelândia, no Centro, um casal de abrigou sob a entrada de um prédio.

“O lugar melhorzinho que a gente tem para ficar é aqui. Ela está grávida e a gente não tem para aonde ir. A gente não está aqui para pedir uma casa, não. Mas se dessem um trabalho para gente, para a gente trabalhar e mudar de vida, a gente ficaria muito feliz”, disse Leandro.

Apesar das dificuldades serem maiores, o sentimento de quem mora nas ruas não é muito diferente dos que têm casa quando: carência de afeto.

Questionada sobre o que mais queria no momento, Maria do Carmo Campos foi enfática: “era estar com a minha família”.

“Eu não tenho emprego, eu não tenho nada. Não, eu tenho tudo. Eu tenho você para me dar atenção agora”, disse uma moradora de rua que se abriga nos arredores do Largo da Carioca, no Centro.

A solidariedade é fundamental para essa população que mora na rua e conta, nesta pandemia, com o auxílio voluntário de grupos de ajuda, que distribuem alimentos, máscaras e afetos.

“Se não são eles, a gente morre de fome”, enfatizou um morador de rua.

“A maioria da população de rua não tem máscara, não tem comida, não tem roupa. A importância da máscara para eles é talvez maior do que para a gente. Porque eles estão muito mais expostos ao vírus do que a gente. É um povo que já não tem casa, então o ‘fica em casa’ para eles é tão inusitado ouvir que eu acho que uma máscara já pode se resumir como um abraço em forma de sorriso. As pessoas não podem receber um abraço, mas elas podem receber um sorriso”, disse uma voluntária que distribui máscaras com sorrisos estampados aos em teto.

O afago em forma de máscara com sorrisos é criação de publicitários, artistas plásticos, ilustradores e cartunistas famosos, como Ziraldo. Gente criativa que também são encontradas pelas ruas do Rio, como um catador de latinhas que declama suas poesias nas calçadas.

“Mais vale falar que não me ama, falando a verdade, do que falar que me ama, usando a falsidade”, declamou Sérgio. Ele é analfabeto, não sabe ler nem escrever, mas sabe que a poesia nasce pelo sentimento. Ele tem apenas uma muda de roupas, e inúmeros poemas que guarda na memória. É com ela que ele carrega sua cama e ganha-pão: um amontoado de latinhas de alumínio que ele recolhe pelas ruas.

“A minha ajuda é a minha fé”, declarou o poeta Sérgio quando questionado se recebe alguma ajuda do governo.

Quando conversou com a reportagem, ele carregava sobre a cabeça cerca de 20kg de latinha, o que, segundo ele, lhe renderia aproximadamente R$ 50. Com as praias e ruas vazias, ganhar dinheiro ficou ainda mais difícil para ele. Para conseguir quantidade semelhante de latas, ele leva agora mais de uma semana. Mesmo assim, ele não perde a esperança, nem as rimas.

“Perdendo alguma coisa nessa vida, não devemos reclamar. Toda folha quando cai, nasce outra no lugar”, asseverou o poeta Sérgio.

A Secretaria Municipal de Assistência Social e Direitos Humanos disse que instalou tendas pela cidade para atender à população em situação de rua e que as equipes já fizeram mais de 26 mil abordagens e acolhimentos na pandemia, além de distribuírem cerca 7,5 mil kits de higiene.

Ainda segundo a secretaria, não se sabe quantas pessoas vivem nas ruas do Rio atualmente. O censo que a prefeitura iria fazer a respeito dessa população precisou ser adiado em função da pandemia.

Fonte: G1.com


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